Suzana Herculano-Houzel
Atenção para o desafio: um, dois, três e… Não pense em um elefante cor-de-rosa! Conseguiu? Duvido muito. A razão para um rechonchudo elefante cor-de-rosa aparecer automaticamente em sua mente é a mesma pela qual crianças pequenas têm dificuldade em obedecer a “nãos” variados: o cérebro ativa automaticamente suas representações de “elefante-cor-de-rosa”, “por-a-mão-na-tomada”, “pular-do-muro” ou “atravessar-a-rua” toda vez que ouve essas palavras.
Quando são precedidas por um “não”, o córtex pré-frontal entende que deve impedir a execução dos programas respectivos, mas, como o pré-frontal infantil nem sempre consegue fazer isso, o “não pule!” vira um convite ao desastre. Como evitá-lo e conseguir que uma criança não faça o que não deve? A dica da neurociência é tirar partido da própria ativação automática de idéias e aprender a usá-la a seu favor.
Isso requer algum treino, é verdade, mas você tem muito mais chances de conseguir que uma criança não pule do muro alto se você fizer o seu córtex pré-frontal – o seu, leitor, já crescidinho – conter o impulso de gritar “não pule!” para, ao invés disso, dizer “Fique bem quietinho!” enquanto você se aproxima. Devido justamente à ativação automática dos programas motores, é muito mais fácil conseguir, com uma ordem, que uma criança faça algo inofensivo, como ficar parada, do que obter de seu córtex pré-frontal controle suficiente para não fazer algo perigoso.
Aproveitar a facilidade do cérebro infantil para dizer “sim” resolve até problemas mais inofensivos do dia-a-dia, como minha irmã uma vez demonstrou. Uma tarde, quando nada mais convencia minha filha de uns três anos a largar os brinquedos para entrar na banheira, minha irmã resolveu o problema convidando-a, em sua voz mais animada, de olhos arregalados, dando pulinhos e batendo palmas de alegria e excitação, como se aquela fosse uma oportunidade ímpar: “Tive uma idéia: vamos tomar banho? Vamos? Vamos???”. Ela foi.
Ser positivo e sugerir às crianças o que elas podem fazer, ao invés da besteira do momento, é mais agradável e menos frustrante para todo mundo do que lutar com negações, principalmente quando as alternativas permitidas são atraentes e interessantes. Deixo aqui, então, um convite ao leitor: experimente usar o seu córtex pré-frontal, já maduro, para não dizer “Não faça!” à sua criança e, ao invés disso, oferecer-lhe coisas que ela possa fazer. Ajude o cérebro do seu filho a dizer “Sim!”.
SUZANA HERCULANO-HOUZEL, neurocientista, é professora da UFRJ e autora de “O Cérebro Nosso de Cada Dia” (ed. Vieira & Lent) e de “O Cérebro em Transformaação” (ed. Objetiva)